Chuva de pedras…


Não sei se o jogo de futebol foi com o Arrifanense ou se com o Couto de Cucujaes!?

Sei que era um jogo decisivo e o Campo de S. Sebastião estava cheio a rebentar pelas costuras... havia gente empoleirada em todo o lado e as janelas e varandas apinhadas... nunca o Bairro da Venda Nova tinha visto tanta gente...

Lá dentro o entusiasmo era total... as duas equipas procuravam desfazer o empate 0-0 e numa jogada genial Evangelista cruza Tota amortece com o peito e Lélé não perdoa e fusila a baliza adversária! Estava feito o golo, com a vitória seríamos Campeões Distritais!...

Mas de repente e quando faltava um minuto para acabar o jogo, o árbitro inventa um penálti a favor do adversário!!! 

Estava o caldo entornado!!! 

Já nem sei se o penalty foi marcado ou não... o campo foi invadido e a equipa de arbitragem perseguida!... Entra a GNR em acção... que grande confusão!...

Eu a tudo assistia da janela da casa da Tia-Lídia (mulher do Daniel “Bicho”, sapateiro), casa ao lado da oficina Silva & Irmão, que fora a casa dos Cagalhões, em frente à Capela de S. Sebastião.

Junto à capela havia uns grandes montes de paralelos de calcário para calcetar os passeios... os montes desapareceram e só se viam paralelos no ar!

Não me lembro como acabou mas a coisa esteve feia com a intervenção da GNR e muitas cabeças rachadas... 

para regressar a casa com minha irmã e Tininha tivemos de esperar pela noite até que tudo sossegasse... Meu pai já andava em cuidado, ele que era director de campo e que tivera de sossegar alguns ânimos...


Dali do Largo da Capela, seguia para este a Rua Dr. Manuel Alegre, a mais aristocrática da Vila, com lindas vivendas, com destaque para a de Augusto Valente de Almeida, a dos Pimenta e a do Dr. Amilcar e lá para o fundo do Capitão Coutinho e Gustavo Amaro da Famel... do lado esquerdo, no regresso, a do Dr. Mateus Barbas, a dos Camossa... mas haviam muitas mais... da familia Flores, do Correia da Silva, da familia Rés, da Maria Fataça... a mãe da Albertina e os doces de festa, o Balreira (do Hernâni) e o forno da “manhola”... o “patissola”...e muitas por lá permanecem enriquecendo o nosso património arquitectónico construído.

No largo havia o edifício dos Guerra, naquela altura não sei se o Carménio já tinha o Café S.Sebastião ou se por lá ainda estava a Gráfica Ideal nos seus primeiros passos...

Depois havia a casa de Manuel Valente de Almeida e em frente vivia a família Ramos... Gonçalves e Balreira... e havia a estrada para a Estação dos Caminhos de Ferro passando pela Pensão Hugo, pela casa de Antonio Brinco da Costa e cartonagem ABC, onde antes fora uma serração, e passando a ponte sobre a linha da CP passávamos a cerâmica Guerra & Cruz e seguia-se para o Bairro dos Aflitos, Joinal ou Barreiras...


E da Venda Nova muitos nomes me veem à memória... a ti-Cacilda que não deixava nada por dizer, o Leão, o Tenente Quaresma, a ti-Dália Felícia, o Manuel Rodrigues e a oficina de bicicletas...

E o César Moreno, quem não se lembra de o ver tocar o seu trompete à varanda virado para o Campo de Futebol... E o Reisinho? E nas manhãs de domingo o engraxador ao som da música da rádio! O Zé Vala... E o latoeiro que nas horas vagas era chofer da biblioteca ambulante da Gulbenkian... e da casa da figueira, do ti-Élio, pai do Quinzinho... era a Rua Dr. Adolfo Portela.

Lateralmente havia a viela do Campo de Futebol com o papagaio do Relvas, o mais irreverente do país, assobiava às garotas e chamava ladrão aos árbitros e gritava : Fora o árbitro!...

Ali havia a oficina do August “Maleiro”... quantas malas de porão dali saíram para ir para as Áfricas e para o Brasil!? Mais à frente o Angelino Dias e familia... a Viela que viu nascer a indústria de ferragens de Águeda com um dos seus pioneiros, o velho Alfredo Guerra e seus filhos Carlos, Antonio, Fê e Bernardo... Mais tarde o local deu lugar às indústrias gráficas... 


No Largo da Venda Nova onde esteve a primitiva Capela em honra de S. Sebastião, cuja demolição seria de má memória... onde estava o chafariz e a “secular” árvore hoje reduzida ao tronco carcomido... e viviam famílias como os Fataça e outros... e havia sapateiros, peixeiros e doceiras... largo de tascas e tavernas: a da Serrana, a da Zínia e a do Vidal um pouco abaixo... resta agora a mercearia do Albano (há mais de 30 anos) , que julgo antes ter sido a sede do Recreio Desportivo de Águeda... e a tasca do Zeca “Reisinho”...

Daqui saem duas ruas... 

a Rua de Armando Castela, onde vivia o Alfredo “ Belga”, o Fê Guerra e a ti- Quitas, o  Zé Gomes da Clélia, os Silva, o Lagareiro e tantos outros e, mais abaixo, o armazém dos Encarnação, e em frente Hernâni Pinho... que era Amaro...

e a Rua Eng. Júlio Portela, do armazém com cheiro a café torrado de Antero Varanda, de artes e ofícios: sapateiros, serralheiros, marceneiro, funileiros...  e onde viveu a Tia Assunção, que vestia os anjinhos da terra, casada com o Crespo armador, o Chefe Relvas, a ti-Eduarda, a ti-Rosa “Floca” e a sopa dos pobres onde se distribuía o leite em pó e aquele queijo amarelinho aos mais  carenciados... E famílias como: os Pinto, os Santos, os Camelo, os Nadais, os Rachinhas, os Breda e o Dr. Adolfo Ribeiro...

Depois era a antiga Escola Industrial e Comercial (antes Escola Industrial e Comercial Pedro Nunes e depois Madeira Pinto) e a descida para a Câmara Municipal com a rua da Fonte ou a subida para o Adro...

Assim era a Venda Nova, cujas estórias serão agora os meus leitores a contar, bem como relatar as alcunhas dos moradores...

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