Percurso turístico pela ÁGUEDA… da Vila de ontem… cidade de hoje… ÁGUEDA eterna!
O mercantel de mestre Balreira manobrava para ancorar no cais... acostou e os barqueiros antes de começarem a descarregar a carga arrearam o mastro e enrolaram as velas...
Saltei para o cais e subi os degraus enquanto as sardinheiras iniciavam a correria de canastra à cabeça subindo e descendo os degraus do cais acartando do barco a carga trazida nessa manhã... sardinha brilhante e prateada!
A azáfama era grande no largo contíguo ao Cais das Laranjeiras... Largo da “Senhora da Boa Morte” por ali ter estado a hospedaria que recebia os peregrinos e doentes no que terá sido o Bairro do
Barril... mas terá sido mesmo hospital aquando das invasões francesas (1809/1812)... e depois mudou-se para os altos da vila.
O bairro era habitado pelas gentes ligadas ao rio e por inerência ao mar... muitas oriundas mesmo da beira-mar: Murtosa e Ovar, de onde vieram famílias já com filhos e seus haveres e ali se estabeleceram... os Balreira, os Cura... Rendeiros... Resendes… Marinheiros... alguns viviam também em Além da Ponte e muitos no Sardão...
Foi largo do mercado e mudou de nome para Largo Dr. Elisio Sucena enquanto a rua que foi alameda a caminho de Paredes era e é a 5 de Outubro.
Com a demolição das casas com varandas para o rio, o Barril ficou reduzido à correnteza de casas equivalente ao casario hoje existente onde existiam os armazéns de sal e peixe, algumas lojas e vendas e a Rua de S. Bento onde não faltariam tabernas e tascas para barqueiros, almocreves, peixeiros, sardinheiras e regateiras, mitigarem a fome e beberem umas litradas...
Percorrendo a Rua de S. Bento paro na fonte donde brota incessante jorro de água cristalina e mitigo a sede… admiro a arte urbana dos moradores e ganho coragem para enfrentar a escadas que subo até aos muros altos onde um portão indica Alta Villa… tento espreitar e desvendar o que atrás desses muros estará, mas só consigo olhar as copas das árvores seculares… de repente imagino aquela quinta de muros derrubados, jardins renovados e casas e muros coloridos onde crianças alegres brincam entre risadas e brincadeiras…
Olho para poente e vejo em frente uma casa secular com arquitectura invulgar denotando diversas construções e ampliações ao longo dos tempos… uma visão surge e vejo um edifício branco renovado exalando cultura e transpirando acordes musicais… por detrás a silhueta da velha torre sineira da Igreja da Vila… naquele lugar terá nascido o Casal de Lausauto…
Mas ali a meus pés uma outra construção invulgar inspirada na arquitectura anglo-saxónica com seu telhado de minaretes apontados ao céu…
Continuo o meu caminho e entro no bairro da Venda Nova. No largo uma visão de uma capela velhinha a S. Sebastião… mas a modernidade tudo mudou e até o campo da bola levou… lá a modernidade e o betão criaram o coração da cidade…
e olho as casas humildes baixinhas do que fora a Venda Nova e de repente imagino um lindo mural com semblante angélico numa profusão de cores… a Venda Nova continua viva!
Continuo a descer… rua de casa antigas, algumas com muita história lá dentro… já não vejo a Escola industrial e comercial… antiga rua da fonte onde tantas mentes foram despertas para a vida… também não vejo o “piolho”, nem a velha fonte, nem o edifício imponente da Câmara que ostentou o mui nobre brasão da Romanis Aeminium até ao dia que esse sonho se desvaneceu!…
Praça Nova… subida para o Outeiro, jardim com o lago dos cisnes e o velho coreto… lembro os acordes da Banda Nacional Republicana há muitos muitos anos e depois o luto caiu sobre a Vila…
Paragem dos Azeitonas a caminho do Caramulo…
Rua de Cima… tanto comércio e sempre a fervilhar de gente no dia a dia…
Escadinhas do Adro… quebra costas e um sonho meu que se tornou realidade… a Via Sacra até ao velho cruzeiro do Adro - o Calvário… António Sucena no Turismo com Dr. Silva Pinto e Eng. Celestino e meu sonho foi realidade… outros havia e ficaram na gaveta!
Olho a Igreja Matriz de Santa Eulália, o Cemitério e a velha Escola Primária onde gerações aprenderam os números e as letras as vezes com a ajuda da “Quiteria” ou do sibilar do bambu e a velha árvore de tantas brincadeiras… ainda lá está!
Desço a Viela dos Padres e parece-me ver o velhinho Padre Matos com seu alvo cabelo a sair de casa a caminho da Igreja… desço o último lanço de escadas e “encontro” o casal Nai e ti-Floripes, ele a caminho do talho dos cabritos e ela para o quiosque no largo Senhora da Boa Morte!
E de novo na Rua de Cima onde uma disputa entre os três grandes do futebol acontece… com o Benfica campeão o ti-Chico Balreira, à esquina do Bazar Gomes (antes retrosaria da Rosa Nó e depois pastelaria Santa Eulália), benfiquista dos cinco costados a dizer: Piu…
o Saraiva adepto do Sporting fugia para o fundo da sapataria e o portista Ribeiro para a cave da loja de fazendas… os restantes comerciantes à porta das lojas riam à bandeira despregada enquanto ti-Augusto Zica coçava o boné e dava a última puxada na pirisca ao canto da boca!
O Julinho com o seu carro de mão levava os jornais ao Sr. Conde e o Zé Cheta em grande estilo fumava uma cigarrada… olhando no vazio as belezas de Águeda…
A caminho do Botaréu uma paragem na rua de baixo para ouvir os canários na marcenaria do ti-Chico, cantando ao desafio com o deslizar da plaina e onde o nosso poeta maior com vida se inspirava com Alma…
E o rio? O rio ali aos nossos pés para lavar nossas mágoas na espuma das suas águas…
a montante as noras gemendo e regando os campos de milho… e a alegria da rapaziada nos belos mergulhos…
No areal a roupa a corar e as lavadeiras esfregando nas travessas a cantar:
“Bate lavadeira, lavadeira bate
Que as nossas cantigas já não tem remate!…”
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