À lareira pelo S.Martinho...
O avô Adriano com a ponta da tenaz afastava as brasas e fazia saltar uma castanha do borralho...
“Estejam quietos lambões esta é para a Teresinha...”
fácil será identificar os lambões, o autor deste escrito e primo To-Zé, que com as garras afiadas, como duas águia
s, ou não fossem ambos benfiquistas, disputavam as castanhas que iam ficando assadas ali no borralho por debaixo da panela das três pernas, que fervia a água para o escoado... bacalhau, batatas e couve baixa... o meu pai chamava-lhe o trezentos e sessenta e cinco... era o aconchego do jantar a que chamávamos ceia.
A avó Arminda com sua figura pequena e irrequieta lá andava na cozinha e perguntou ao marido: “Ò Adriano já queres o teu caldo?” Nem obteve resposta porque, pela porta dentro, entraram a Tininha e a Alicita que vinham do trabalho no escritório da Reunidas em Assequins... A tarde tinha estado cinzenta e fria, e elas logo procuraram um cantinho à lareira para se aquecerem e disputarem uma castanha...
O avô com a sua mão deformada das artroses lá ia manuseando a tenaz... aquelas mãos que ainda de podão e navalha preparavam os arcos e as correias na profissão de toda a vida, a de Canastreiro. Herança de seu pai, o bisavô Belchior do Pombal de Sever do Vouga. Foi o filho primogénito de sete filhos do casamento de Belchior com a delicada menina da Casa do Romezal (Silva Escura), a bisavó Adelina... e até tinha apelido brasonado - Lobo - mas este foi abandonado pelo Avô Adriano, que sempre assinou Adriano Tavares, razões de família que não lhe agradaram e que nunca nos contou!
Pois, voltando às mãos deformadas do avô Adriano, lembrar o exímio músico que foi, tendo chegado a primeiro clarinete da Música de Águeda, na altura dirigida pelo grande Godofredo Duarte... depois teve de abandonar os instrumentos mas ainda me lembro de o ver dar aulas de solfejo a uma menina que tocou acordeão na Igreja Evangélica de Águeda...
Recuando no tempo para recordar como o Serrano de Sever do Vouga, o lobo do Arestal, veio para Agueda... Bem nessa época seria fácil a Linha do Vale do Vouga já tinha o ramal Sernada - Aveiro e bastava ir a Paradela apanhar o “chancas”... e foi o que fez mas com destino a Aveiro para o serviço militar... como músico foi tocar para a banda do Batalhão e teve sorte de não ir para a Guerra de 1914, porque a banda à última hora não embarcou... mesma sorte não teve o seu amigo aguedense José Pedro Melo que foi para à Flandres e de lá trouxe padecimentos que o atormentaram toda a vida.
Pois o amigo José Pedro convidava aos fins de semana o Adriano a vir a Águeda tocar na música da sua Terra e assim conheceu sua irmã, minha avó Arminda, com quem viria a casar.
José Pedro Soares de Melo era um musicologo, sendo autor das músicas da revista “Do Barril à Venda Nova”, com letras de Serafim da Graça, e o seu amigo Adriano lá estava em tudo o que fossem pautas, claves, colcheias e semi-fusas...
O Avô Adriano tocou na Música de Agueda, nas tocatas dos ranchos dos Santos Populares, em récitas e festas e chegou a ter um Jazz...
terminou a sua actividade como último maestro da Música de Águeda (in “Da Fundação das Filarmónicas em Águeda”, de autoria do historiador Deniz Ramos)...
Entretanto chegaram as tias Lídia e Alice e a avó com a escumadeira tirava da panela de três pernas a janta!
A Alicita chamava por mim... o nosso pai já deveria estar em casa e ele gostava de ver a ninhada reunida à mesa a horas... mas também era perto!
E lá fomos... mas com vontade de ficar e com avós, tias e primos, partilhar o que para a mesa vinha, com alegria e satisfação!
A consoada já estava para breve e aí seriam noites com serões bem passados...
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