Noite bendita... Noite de Paz...

A noite caía... No ar pairava um cheiro a fumo das muitas lareiras acesas que aqueciam as casas naquela gélida noite... Uma neblina vinda do rio adensava-se sobre a vila dificultando a visão de quem percorria as ruas da baixa... quanto mais vislumbrar as luzinhas das gambiarras e árvores de Natal colocadas nas janelas das casas... A ténue luz da via pública já nem permitia identificar os poucos transeuntes que, apressadamente, após as últimas compras, queriam regressar ao conforto do lar... Era a noite da consoada e todos queriam estar à mesa no momento em que a fumegante travessa viesse da cozinha com o melhor bacalhau do ano, as batatas, as couves, a cenoura e os ovos... No prato já o alho beijava o azeite num namoro demorado aguardando o bacalhau lascado e acompanhantes...
Punha-se vinho nos copos... era noite de festa! A satisfação inundava os rostos, alegres conversas animavam os comensais e os risos andavam no ar... Limpava-se o azeite do prato com o miolo da broa de milho... era noite de alguma fartura mas nada se podia desperdiçar... Arrumava-se a mesa e começavam a ser postas na mesa as doçarias: bilharacos, rabanadas, sonhos e coscorões... mas também as frutas secas: nozes, figos, ameixas, pinhões... e as broinhas de mel Castelar... O Bolo-Rei era mesmo o rei da festa e a pequenada esperava a sua fatia a ver se tinha direito ao brinde... ou à fava!... Mas nesse ano havia uma outra estrela na mesa... o Bolo de Santa Eulália, o bolo de Natal de Águeda, confecção da Casa Candeeiro e que nesse ano com encomenda atempada tinha chegado lá a casa... Abria-se o espumante e bebia-se também Vinho do Porto... era noite de alegria! Sem exageros, pois claro! As risadas das crianças inundavam o ar!... Depois cantavam-se canções de Natal, faziam-se jogos e adivinhas e os adultos trocavam entre si alguns presentes... as crianças essas seriam contempladas pelo Menino Jesus que, nessa noite mágica, viria ao Mundo e deixaria prendinhas nos seus sapatinhos, previamente colocados junto à lareira... Aproximava-se a meia-noite e era tempo dos mais afoitos enfrentarem o frio da noite e ir à igreja à Missa do Galo! Mal despontava a manhã era uma algazarra pela casa com a pequenada a ir ver as prendas nos seus sapatinhos... E cantávamos ao Menino Deus no Presépio... Natal, Natal... Dia sem igual... Natal, Natal, dia sem igual! Ò que Ventura, Vir adorar, Quem veio ao Mundo Para nos salvar! Ao almoço a família voltava a reunir-se... As sobras da Ceia de Natal eram transformadas numa Caldeirada Fina... bacalhau, batatas, cenoura, ovos... tudo às rodelas e colocado em camadas numa assadeira, bem regado com azeite, coberto com molho branco e indo ao forno... Depois comia-se o galo, que ao longo do ano tinha sido criado na capoeira e reservado para este dia especial... assado no forno e acompanhado com arroz de açafrão... amarelinho e com rodelas de salpicão! Voltavam as gulodices... comia-se, bebia-se e havia alegria em família... Era Natal... Um Natal em família... chegamos a ser dezoito à volta da mesa naquela consoada... Glória a Deus nas alturas... e paz na terra aos homens de boa vontade... retalhosdeaguedaantiga.blogspot.com By João Carlos Breda

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Pastel de Águeda... Da Ti-Quitéria ao forno da Loura e ao fogão da Gininha...

Judeus de Águeda e suas judiarias...

Responso a Santo António...